Colunaum

COLUNAUM: ORGANIZED KONFUSION

Vamos organizar!

Escriba

@

Parteum

Um dos receios da minha geração de artistas, corrijo, um dos meus receios é dar quase certo. Viver perto do sucesso sem alcançá-lo plenamente. No skate, talvez, isso se assemelhe ao viver do PRO que, com algum brilho e pelo menos um patrocínio médio, atravesse a carreira sem ser lembrado pelos feitos de sessão e/ou campeonatos. Hoje, até gente grande perde patrô por ter pouca exposição midiática. Nada relacionado à habilidade, performance ou graça, no melhor uso possível da palavra. Na música, isso seria como a vida do personagem preso ao estalar de dedos. Alguém o vê na rua e estala os dedos ao tentar lembrar de onde te conhece. São muitas versões de medos bobos e persistentes. Há uma ligação com ser conhecido o suficiente pra permanecer – na cena, ou na mente do povo, ou com o mínimo de alcance pra seguir dizendo ao mundo que você merece viver do que decidiu fazer da vida. Não é simples reconhecimento. Tem um pouco de recompensa, também. É observando esse quadro, de tantas cores e nuances, que lembro de uma dupla de MCEEs que anda comigo desde o segundo álbum, Organized Konfusion: Prince Po(etry) e Pharoahe Monch. The Extinction Agenda (1994), além das participações de OC e Q-Tip, tinha ares apocalípticos, as trocas de flow e ideia entre Po e Pharoahe e uma urgência no discurso, do começo ao fim.

Muitos álbuns dessa época têm a construção dos audiobooks de hoje. É possível perceber as “bases” como meros acompanhamentos da poesia que vive dentro delas, mas fica muito difícil menosprezar os feitos do Buckwild (DITC), Rockwilder e da própria dupla, nessa construção. Digo isso, pois até “possuir” esse álbum, as bases e os versos nem sempre me pegavam no mesmo grau. Fora Illmatic e 93 ’til Infinity, esse era o disco que eu usava pra criar minhas mixtapes dos tempos de cursinho. “Maintain”, produzida por Rockwilder, foi uma das canções que eu cansei de ouvir caminhando pela Avenida Goiás. Tempos de ir à companhia telefônica, ali do lado da antiga prefeitura de São Caetano do Sul, pagar depósito e falar com os amigos que já estavam se aventurando na Califórnia. Era por ali que eu ficava, manobrando sozinho num banquinho, torcendo pra que as pilhas alcalinas durassem até eu voltar pra casa. A arte de Organized Konfusion, passando por The Equinox (1997), sempre me propôs um ideal de criação, conversa e aculturamento. Da faixa criada a partir do ponto de vista de um projétil ao contorcionismo multissilábico de ambos, Po e Pharoahe. Da maloqueiragem literata do Po misturada à raiva controlada do Pharoahe…

Era tudo uma questão de estar disposto a ir além do que os óculos de Ski e as roupas pesadas de inverno sugeriam nas fotos promocionais que vi na Rap Pages, ou no vídeo dos tempos dourados do Yo! MTV Raps madrugadeiro. Canções como “Hate”, “Stress” e “Invetro” têm a energia dos filmes obscuros de Gene Hackman, se equilibrando num sample de Herbie Hancock que outros grupos de Hip-Hop não desgastaram. OK é caso raro na história da cultura e do mercado fonográfico. Tive a oportunidade de trocar ideia com ambos, pegar autógrafo nas fitinhas e CDs. Nem todo MCEE do meu Top 10 vendeu milhões de discos. O que me interessa é o flow, as conversas propostas, a construção, o timbre de voz e a marca registrada de cada um deles. Sigo curtindo OK como se estivesse atrasado pra um simulado do ETAPA, em 1994. Vamos organizar!

Compartilhe
Publicado em
28.10.2025
Categorias